04 setembro 2014

Voltar às origens


Estávamos na nossa comunidade participando de uma celebração, as pessoas responsáveis pelos cantos estavam um pouco desanimadas, sem muito interesse pelo que estavam realizando, parecia que estavam fazendo porque não tinha mais ninguém disponível e a leitura falava dos talentos e nos convidava para colocá-lo a serviço, para não guardarmos. Sentimos neste instante que já era hora de fazer algo pela comunidade, de dar a nossa contribuição, porque sabíamos que com a participação de todos é que acontece a verdadeira celebração. 

Ao nos colocarmos a disposição da comunidade, quase sempre dedicamos o nosso tempo para realizar aquilo que realmente gostamos de fazer. E isto é natural, colocamos o nosso talento a serviço. O talento é a nossa inclinação natural para realizar determinada atividade. Mas sabemos que só o talento não é suficiente para que a atividade a ser realizada tenha sucesso ou atinja um nível de qualidade satisfatório. E quando a atividade é relacionada a música então, fica ainda mais complicado. 

Começamos a tocar, colocando a disposição o nosso talento musical. E como todo mundo que começa o que sobra de vontade falta em qualidade. Com o passar do tempo vamos evoluindo, lapidando o nosso talento, melhorando a técnica, entendendo a teoria, adquirindo instrumentos com mais fidelidade, aprimorando a nossa percepção. Enfim, chegamos num nível de qualidade muito bom, às vezes comparado a profissionais.

Para chegar neste nível de qualidade passamos por várias etapas, assistimos um par de vezes aquela apresentação ao vivo do nosso músico de referencia, ficamos horas incomodando o nosso vizinho que já tinha bastante experiência, gastamos nossas economias comprando diversos instrumentos até elegermos um para ser nosso companheiro. Montamos o nosso setup e estamos muito satisfeitos e orgulhosos da nossa aquisição.  

Quando chega neste momento somos convidados para tocar na celebração da nossa comunidade. Muito legal e o meu setup recém montado, com aquela guitarra Gibson de cinco mil reais, pedaleira de dois mil, cubo valvulado da Marshall de  três mil vai ser apresentado ao público, vai ser justificado tamanho investimento financeiro. Mas para nossa decepção, a distorção daquela pedaleira não combinou muito com o canto entoado pela comunidade. O alto volume do cubo valvulado abafou a voz do cantor e a nossa preocupação com a última técnica aprendida no Cifra Clube não nos permitiu ver que instantes antes o comentarista havia pedido para ficarmos em silêncio para refletir sobre o que acabávamos de ouvir na leitura.

As críticas vieram e como sempre não de forma agradável, e chegamos a conclusão que a comunidade não entende nada de música, que não evoluiu, que está arcaica, que não quer se modernizar, que, enfim, estamos totalmente certos e os outros estão errados, estamos num nível acima.  

Será? E se nós tivéssemos pego  aquele velho Tonante, ligado naquela velha Top500 e acompanhasse de forma harmônica o cantor, teria sido melhor? Claro que não! Mas se tivéssemos usado a guitarra de forma harmônica,  sem distorção, mas limpa com um pouco de reverberação e o volume do cubo abaixo da voz do cantor? Aí sim.

As vezes menos é mais. O que aconteceu é que enquanto estávamos buscando a excelência da técnica e a fidelidade do equipamento esquecemos do que nos motivou a colocar os nossos talentos a disposição. Lembram: o objetivo inicial era servir a comunidade, contribuir para tornar a nossa celebração mais animada. 

Meus queridos, precisamos de vez em quando voltar às origens. Lembrar das nossas primeiras motivações para que não nos percamos nesse emaranhado de técnicas, equipamentos, teorias e tudo o que lapida o nosso talento, porque talento por si só não é nada, ele precisa espiritualidade, de comunidade e humildade. Devemos ter sempre claro o motivo de tudo o que estamos fazendo: evangelizar através da música, que a nossa música seja motivo de inspiração para que outros se coloquem a serviço e se tornem pessoas melhores, que seja mais um motivo para estarmos junto dos nossos amigos. Numa celebração somos animadores, não atração, somos motivadores para a comunidade cantar.  

Por João Carlos Nascimento - Produtor Técnico do grupo Tons de Deus
joaocarlosrdonascimento@gmail.com 

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